Quais as diferenças entre farinha de milho e Fubá?

Sim, existem diferenças entre farinha de milho e fubá.

Parece uma dúvida boba e não é. Li em um dos primeiros resultados do Google sobre diferenças entre farinha de milho e fubá dizia que eram a mesma coisa e que podiam facilmente ser usados como substitutos um do outro.

Até dá. Porém, como bem sabem os bons cozinheiros, o diabo mora nos detalhes.

Este é um daqueles textos que podem ser de mera curiosidade ou salva vidas, se você está em uma dessas situações:

  • planejou mal a dispensa e viu que faltava um dos dois na hora do preparo da receita;
  • sempre teve dúvidas se é impressão sua aquela ligeira diferença de textura
  • quer planejar melhoras as próximas compras e otimizar tanto custos quanto a qualidade das suas receitas;

Sem mais delongas, vamos aos fatos!

Entenda o que é farinha de milho e fubá

Se você quer entender as diferenças entre os dois, na prática, recomendo que avance para a próxima seção deste post. Nesta parte do conteúdo, vou aprofundar um pouco na origem dos termos e das diferenças entre o que é dito sobre eles no sentido técnico e no sentido cultural (que é o que mais importa na culinária, e logo vai entender o motivo).

Antes de mais nada, é interessante pontuar que — para a ANVISA — fubá e farinha de milho são a mesma coisa: o produto obtido da moagem do grão de milho. A agência até faz uma nota considerando a farinha de milho flocada e biju como outros produtos. Mas, no fundo, é tudo farinha1.

Porém, entre o que define a ANVISA e os detalhes sobre como as coisas são feitas, há um mundo de distância.

O que é fubá

Assim como uma quantia enorme de palavras empregadas na culinária brasileira, o fubá é um termo com origem africana2. Para ser mais específico, da língua Quimbundo (de Angola)3 e significa, simplesmente, “farinha”. Ou seja, aquele produto que botemos passamos algum grão por um moinho.

À diferença de hoje o fubá e a farinha na realidade não eram feitos de milho. Nosso querido grão amarelado tem origem aqui nas américas e demorou séculos para chegar na África. Foi durante a era das navegações portuguesas que o milho chegou em Angola.

Até então, fubá designava farinhas feitas basicamente de sorgo ou painço (sim, o do passarinho, também chamado de milheto).

Como milho foi durante séculos o principal grão produzido no Brasil, caiu de (ao menos por aqui) virar sinônimo dele moído. Tanto o é que, em muitas regiões do nosso país, você pode pedir ‘fubá’ em um empório ou casa de rações e receber um punhado de milho moído — que pouco tem a ver com um ingrediente prático na cozinha.

O fubá que compramos no mercado é então uma versão do ‘milho moído’ tão bem moído que possa ser usado em receitas de pães e bolos, por exemplo. E ele se divide em alguns tipos:

  • a sêmola ou semolina (de milho): é a versão de moagem mais grossa, muito utilizada para algumas receitas bem específicas como broas, cereais matinais e salgadinhos. Dá aquele ‘tchan’ estético quando você quer que fique aparente na receita;
  • o fubá tradicional: é a versão de moagem média, que fornece uma consistência mais firme e ao mesmo tempo um sabor mais acentuado de milho fresco em receitas. É bem utilizado em receitas como a polenta, o angu, também costuma ser utilizado em broas e para empanar;
  • e o fubá mimoso: que a versão mais fina, que vai ser utilizado quando você ainda quer um preparo que absorva bastante líquido e ainda assim tenha uma textura mais delicada. É muito usada em bolos, pães, biscoitos e mingau, por exemplo.

Por diversas razões (que você vai entender jajá) o fubá é bem mais seco e absorve MUITO mais água que a farinha de milho que costumamos comprar no mercado.

O que é farinha de milho

Já a farinha de milho e fubá talvez até devessem ser o mesmo se considerássemos o significado da palavra ou a definição técnica. Porém, em função da nossa cultura sul-americana, a farinha foi ganhando outra forma e hoje é um produto bem diferente.

É interessante pensar que cada região do mundo inventou sua própria técnica para moer grãos: dos moinhos de vento da Holanda, pedras retangulares (como o metate, dos astecas) ou circulares (muito usadas no oriente médio) aos moinhos movidos por animais dos chineses.

Com os ameríndios aqui do Brasil não foi diferente. A técnica tradicional para quebrar grãos veio a se tornar o pilão de madeira maciça — uma versão bem mais pesada que aquele que você já deve ter usado em casa para moer alho.

O pilão, que esmaga, é um tanto quanto limitado em comparação com os moedores. Costuma envolver técnicas adicionais como a adição de água ou cinzas para obter resultados parecidos. Além disso, os povos originais (ainda hoje) tem grande apreço por técnicas de fermentação.

Imagino que por isso — e aqui faço a ressalva que isso é uma suposição minha — acabaram combinando técnicas que já usavam para fazer farinha de mandioca com a pilagem de grãos de milho.

O fato é que, diferente do fubá, farinha de milho era (tradicionalmente) feita pilando o milho para remover o gérmen — que, de forma resumida, é aquela pontinha dura, branca e seca do grão de milho que faz nascer outro pé-de-milho — e então deixada de molho em água. Depois disso, o milho (já amolecido) era pilado novamente.

Essa massa de milho com gérmen removido, hidratada e pilada, é torrada. Vira um bolachão fino muito parecido com o beiju de tapioca, mas bem mais quebradiço. É isto que chamamos de farinha de milho.

Este video explica bem esta técnica, que ainda hoje é usada:

Até hoje, mas em grandes fábricas, este processo é seguido: remover gérmen, hidratar, processar e torrar.

Perceba que isso é bem diferente de mero ‘milho moído’, como diz a ANVISA.

E a farinha de milho branca?

A farinha de milho branca costuma ser feita da mesma maneira que a amarela (tradicional), a diferença está no tipo de espécie de milho utilizada. Existem espécies de milhos de todas as cores: amarelos (tradicionais), brancos, vermelhos, azuis, roxos e até pretos.

Diferentes cores de milho no Peru. Há diferenças entre farinha de milho branco e fubá? E as diferentes cores de farinha de milho?
As diferentes cores de milho | Créditos: Peru Travel/reprodução.

Na prática, não há mudanças muito significativas de textura de um para outro. Na minha opinião, a diferença mora mais no sabor. A farinha branca tem menos sabor de milho e, justamente por ser mais ‘neutra’, cabe bem em certas receitas. Além disso, há fatores regionais/culturais na escolha de cada um. Aqui na região de Sâo Paulo, a farinha amarela é tradicional e raramente usamos a branca.

Digamos que você queira preparar uma receita a base de farinha de milho, mas não queira que o sabor de milho se sobreponha a dos demais ingredientes. Neste caso, a recomendação é usar a farinha de milho branco.

Nutricionalmente? Não fará nenhuma diferença na sua vida.

A farinha de milho vermelho, mais conhecida como ‘farinha de milho crioulo’ aqui no Brasil, tem sabor mais acentuado que a branca. Mas é bem rara de encontrar.

Na prática: como substituir farinha de milho ou fubá

Posso usar fubá no lugar da farinha de milho?

Sim, você pode. Mas lembre-se que precisa estar atento a dois fatos:

  • o sabor de milho ficará mais acentuado;
  • a textura pode apresentar ligeiramente mais seca, principalmente se você não adequar líquido e tempo de cocção;
  • utilize mais líquido do que usaria na receita com farinha de milho, o fubá absorve mais;
  • jamais (leia bem o JAMAIS) jogue fubá diretamente nos líquidos quentes, vai formar bolotas difíceis de se desfazer sem um liquidificador. Dilua o fubá em um copo de água e só então adicione na receita;
  • e cozinhe por mais tempo.

O importante é sempre lembrar que fubá é milho cru. Não importa quão fino pareça aos seus olhos, ainda é milho cru. Por isso, você precisará considerar isso quando estiver fazendo cozinhando: vai levar mais tempo.

Mas, no geral, quebra o galho. Esqueceu de comprar farinha ou faltou metade? Dá-lhe fubá. Com cuidado, vai dar tudo certo.

Diferença nos preços:

O quilo do fubá, geralmente, é mais barato que a farinha de trigo. O motivo disso é que envolve menos processos na produção (como explicado acima) e é menos consumida no cotidiano das cozinhas.

Então se sua meta é diminuir custos com ingredientes, a troca pode ser uma alternativa.

Mas não esqueça que isso aumentará o tempo de cozimento, exige treinamento da equipe e exige ajustes na quantia dos líquidos da receita.

Posso usar farinha de milho no lugar do fubá?

Sim. Particularmente é o que eu acabo fazendo sempre. Gosto mais da textura dos preparos com a farinha de milho e há um sabor levemente (bem levemente) mais ácido de milho fresco.

Mas tome atenção com os seguintes fatos:

  • a textura tende a ficar mais cremosa/macia;
  • a farinha de milho absorve menos água (isso é particularmente importante considerar se estiver fazendo pães);
  • a farinha de milho é mais cara que o fubá;
  • e o tempo de cozimento cai bastante no caso de caldos.

A polenta feita com farinha de milho fica pronta em instantes. Acaba sendo uma jogada interessante se você está querendo poupar tempo na cozinha.

Uma dica interessante, caso esteja fazendo pães, é usar fubá na forma antes de alocar os pães e polvilhar sobre eles antes de assar. Vai dar aquela aura de pão rústico.

Diferença nos preços

Mora aqui o maior problema. Dependendo da região e do momento do mercado, a quilo da farinha de milho pode custar quase o dobro do quilo de fubá.

Se você está precisando diminuir seus custos com mão de obra, reduzindo tempo de preparo e trazendo praticidade para as rotinas, usar a farinha de milho pode ser uma boa alternativa.

Mas se não é o caso, trocar o fubá pela farinha de milho só significará aumento nos custos sem mudanças tão significativas nos resultados.

Citações:

  1. Você pode ver as definições nesta RDC da Anvisa, por exemplo. Mas ela aparece em outras também. ↩︎
  2. Matéria da E-cycle também me informativa sobre o assunto. ↩︎
  3. Nesta matéria do Correio 24 Horas, Vinicius Nascimento faz o perfil do baiano Niyi Monanzambi, um dos poucos fluentes da língua Kimbundu aqui no Brasil. ↩︎

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