Veganismo: gastronomia inovadora muito além de restrição alimentar

veganismo

Querendo dicas de como encarar o veganismo em seu restaurante muito além de como criar uma opção pra jogar no fundo do menu? Veio ao lugar certo.

Em 2016, o chef francês Alexis Gauthier, detentor de uma estrela Michelin e conhecido por servir 20 quilos de foie gras por semana em seu restaurante londrino, anunciou uma decisão que chocou o mundo da alta gastronomia: virou vegano.

Cinco anos depois, o Gauthier Soho já era o primeiro restaurante de alta gastronomia francesa completamente vegano do mundo. Gauthier revirou a cena da haute cuisine francesa.

Em um ambiente onde foie gras era símbolo de status, ele OUSOU servir cenouras defumadas e cogumelos selvagens em pratos de… 200 euros (multiplique isso por 6 e terá uma ideia do valor em reais. Mas olha só o resultado: a lista de espera do Gauthier só aumentou.

Os sabores que transformam o prato comum em uma experiência digna de nota tem centenas de fontes, muito além das carnes. Se você acha que sabores intensos e satisfação só vem de carne, você está preso num porão de cozinha. Mas cá estou para atualizar vossos conhecimentos.

A Descoberta do sabor

Na culinária, o grande astro dos sabores é o umami, que se revela em múltiplas fontes quanto falamos de pratos veganos/vegetarianos:

  • cogumelo shiitake seco, de sabores profundos e terrosos;
  • missô (aquele fermentado artesanalmente por semanas);
  • tomates assados lentamente até concentrar todo o sabor;
  • algas marinhas;
  • e o molho de soja, principalmente aquele envelhecido em barris de madeira.

Esses ingredientes são bombas de umami. Na mão certa, um punhado de cogumelos faz aquele seu filé mignon predileto parecer comida de cantina.


🔍 UMAMI UNDERGROUND

Em 1908, num laboratório improvisado em Tóquio, o professor Kikunae Ikeda ficou obcecado por entender por que diabos o caldo de algas kombu era tão viciante.

Depois de ferver 40 quilos de alga (imagine o cheiro dessa loucura), ele isolou o glutamato monossódico – *o mesmo tempero que décadas depois seria demonizado em restaurantes chineses por aí. *

O sacana do Ikeda não só descobriu o quinto sabor básico como também patenteou essa bomba de sabor e ficou rico vendendo glutamato.

Mas como o universo não dá voltas, ele capota: a indústria da carne se apropriou do umami como marketing, enquanto o sabor original veio de uma… alga. A origem é de planta. Encara essa, carnívoros!


A arte da transformação

A verdadeira revolução acontece quando entendemos que vegetais não são coadjuvantes, mas protagonistas com personalidade própria.

Uma cenoura, nas mãos de um chef especializado em cozinha vegetal, pode ser transformada através de diversas técnicas:

  • defumação com madeiras nobres;
  • fermentação controlada;
  • desidratação em diferentes temperaturas;
  • confitagem em óleos aromáticos;
  • cura com algas marinhas, para dar notas “oceânicas” à coisa toda;
  • e até mesmo assar lentamente em crosta de sal (o que ajuda a concentrar açúcares naturais).

Cada técnica dessas nasceu de algum chef obcecado o suficiente para passar meses trancado numa cozinha, querendo arrancar sabor de uma cenoura como se sua vida dependesse disso.

A real? Funciona.

Inovação na Cozinha Brasileira

No Camélia Òdòdó, em São Paulo, a chef Bela Gil seguiu essa linha de inovação e montou um espaço que vai além do rótulo vegano. Todos os preparos usam técnicas avançadas e criativas para, por exemplo:

  • realizar a maturação controlada de vegetais
  • desenvolver preparos com ingredientes sazonais brasileiros
  • e criar texturas complexas sem derivados de animais.

Um exemplo está no bobó de shimeji com creme de aipim, leite de coco caseiro e um toque de dendê. Para acompanhar, a chef escolheu guarnições como uma farofa de dendê, vinagrete de favas vermelhas e arroz agroecológico (com origem em movimentos sociais importantes) com bertalha — uma PANC muito saborosa que você não vai achar em qualquer supermercado.

A identidade da gastronomia brasileira aparece aí, usando tradições e ingredientes nativos, mesmo que dentro de tendências mundiais.

A arte da transformação no veganismo

No Quincho, restaurante cada vez mais lotado na Vila Madalena, a chef Mari Sciotti transformou sua experiência prévia como maquiadora e figurinista em gastronomia vegetal.

Cada prato é uma composição que lança nos pratos os vegetais em sua forma mais pura — sem tentar imitar pratos típicos de carnívoros.

O Quincho explora os vegetais em múltiplos estados e técnicas, como:

  • cortes e molhos especiais para servir cru
  • técnicas de desidratação
  • cura de vegetais
  • diferentes pontos de cocção
  • formas inovadoras de grelhar ou assar vegetais
  • e, é claro, ninguém proibiu frituras aqui.

Só esta lista acima já dá um norte para você quando está precisando repaginar o menu, em busca de como integrar os vegetais sem forçar a barra.

O menu do Quincho revela a complexidade dessa abordagem em pratos emblemáticos1:

  • tartare de tomate com pimentão defumado: aqui uma combinação de alcaparras fritas, mostarda Dijon e uma emulsão vegetal fazem a vez;
  • cenouras assadas: parece simplório, mas são (bem) guarnecidas com homus de pistache e coroadas com pistache caramelizado;
  • lasanha de cebolas: assadas, amargor sutil do tostado vai de mãos dadas com a doçura da cebola caramelizada;
  • burrata cremosa: foge da combinação clichê com tomate seco e rúcula. Aqui é servida com laranja-baía, alcaparras e hortelã;
  • Nhoque ao limone com cogumelos
  • Manjar de coco com calda de licor de ameixa, sorvete e farofa de coco

O Futuro do Sabor

A cozinha vegana é um ato de rebeldia deliciosa. Enquanto alguns choram pela carne, os verdadeiros revolucionários da gastronomia estão em laboratórios improvisados, transformando jaca em feijoada e fazendo leite de castanha virar queijo maturado.

Se perguntam como criar molhos espessos sem manteiga, extrair umami sem caldo de carne e como estruturar pratos principais sem um gramo de proteína animal.

É uma explosão de criatividade tão violenta que está deixando a velha guarda da gastronomia com cara de quem comeu o cogumelo errado.

Bem-vindos à inovação que parece ter gosto de tudo, menos de mato.

Bate Bola, Jogo Rápido | FAQ

Veganismo não é só salada e tofu?

Tá de sacanagem, né? É tipo dizer que comida francesa é só baguete. A cozinha vegana tem mais técnica que muito restaurante estrelado por aí.

Só carne tem Umami?

Não vicie glutamato de açougue, por favor. Pense em cogumelo koji, missô envelhecido e kombu. Umami de carne fica para trás perto disso.

Vegano sente falta de queijo

Olha só, já tem quem faça castanha de caju virar queijo e deixando muito francês com cara de bobo. Não é imitação, é evolução.

Como faz dar cremosidade sem nata?

Cashew, macadâmia, amêndoa… Se você souber tratar direito essas castanhas, geram cremes incríveis.

Não fica muito caro comer só produto vegano gourmet?

Quem te disse que vegano só come produto importado? @veganoperiferico tá aí provando que dá pra fazer alta gastronomia vegana com ingrediente de feira. É questão de saber, não de grana.

Como que faz molho sem manteiga?

Redução de vegetais, óleos aromatizados, purês de castanhas… técnicas não faltam.

Prato vegano não sustenta

Fala isso pro elefante, pro gorila… Proteína tá em todo lugar. Uma frigideira de grão-de-bico temperado tem mais “sustança” que muito bife por aí.

Mas e a vitamina B12 no veganismo?

Ah, vai começar com essa? Suplementa e pronto, igual seu whey protein do crossfit. Próxima pergunta.

Como vocês substituir o ovo em receitas?

Linhaça, chia, aquafaba… tem mais substituto de ovo que programa de culinária na TV. E muitas vezes fica até melhor que o original.

Para aprofundar:

Se você mordeu a isca e quer mergulhar de cabeça nesse universo da gastronomia vegana que está, aqui vai sua lista de conteúdo vegano premium:

Leia mais:

  1. Confira mais nesta matéria para o Globo da Camila Marques ↩︎

Compartilhe o conteúdo:

5 1 voto
Classificação do artigo
Inscrever-se
Notificar de
guest
0 Comentários
mais antigos
mais recentes Mais votado
Feedbacks embutidos
Ver todos os comentários

Confira também:

plugins premium WordPress